1.A Missão Vicentina alcança a Índia
Ocidental (Américas)
Vicente de Paulo (1581–1660) fundou a Congregação da
Missão em Paris (França) em 1625 (HERRERA, 1949). Ainda em vida (1640), desejou
enviar seus missionários para Pernambuco das Índias, assim era chamado o Brasil
na Europa (COSTE, SVP, II, 468). “Também em 1743, Dom Botelho de Matos
solicitou lazaristas para sua diocese na Bahia” (SANTOS, 2020, p. 151). Em
1807, com a comitiva do Príncipe Regente de Portugal, Dom João VI, vinda ao
Brasil fugida da ameaça de Napoleão Bonaparte, também vieram ao país, três
padres lazaristas, a saber: Pe. Manoel de Brito, que autorizado pelos seus
superiores, serviu como reitor do seminário São José do Rio Comprido – RJ
(1810-1813); Pe. José Cardoso de Brito, seu sucessor (1813-1814), e Pe.
Alexandre Macedo, que atuou como Procurador da Corte (SOUZA, 2016, p. 23). Estes
vieram com a licença de seus superiores e estavam a serviço da corte.
A Congregação da Missão (Lazaristas ou Missionários
Vicentinos) se faz oficialmente presente no Brasil com a chegada dos
missionários portugueses, Padres Leandro Rebelo Peixoto e Castro e Antônio
Ferreira Viçoso, nos finais de 1819. Estes se estabeleceram, inicialmente, em Minas
Gerais, dando origem a Província Brasileira da Congregação da Missão (PBCM),
que, a partir de 1949, contou com a grande presença de missionários de outros
países, sobretudo da França. Além da PBCM, também sinalamos, nesse texto, as
outras províncias do país. Nas primeiras décadas do século XX, chegaram os
missionários poloneses que se fixaram na região Sul; a Província da Holanda
enviou missionários holandeses que se concentraram nas regiões Norte e Nordeste
do país. Desde dois grupos foram criadas as províncias do Sul e de Fortaleza,
formando assim as três províncias que a Congregação da Missão tem atualmente no
Brasil (TEODÓSIO, 2019).
2.A atuação da Congregação da Missão no
Brasil
2.1.Província Brasileira da Congregação da
Missão (PBCM), Rio de Janeiro – RJ.
Os primeiros lazaristas, enviados pela Província
Portuguesa, os Pe. Leandro Castro e Pe. Antônio Viçoso, vieram para trabalhar
numa missão no Mato Grosso. Na ocasião da sua chegada, a missão já estava
ocupada pelos Capuchinhos. Receberam, então, do Rei Dom João VI, a Ermida de
Nossa Senhora Mãe dos Homens, no Caraça, Minas Gerais, com a finalidade de ali
fundar um colégio, atender os peregrinos e pregar missões. No dia 15 de abril
de 1820, os missionários chegaram ao Caraça e ali começaram a pregação de missões,
abriram o colégio (1821) e iniciaram o Seminário Interno da Congregação, tendo
como noviço o padre diocesano João Garcez, que se tornaria o primeiro.
No Caraça funcionava o colégio e, por alguns períodos,
o seminário menor; o colégio alcançou grande fama: ali estudaram diversos nomes
importantes na história do país, governadores e os ex-presidentes Artur
Bernardes e Afonso Pena. Os também ex-presidentes Juscelino Kubitschek e Jânio
Quadros foram estudantes dos lazaristas em Diamantina - MG e em Curitiba - PR,
respectivamente. O colégio funcionou por quase 150 anos, quando em 1968, um
incêndio destruiu parte de suas instalações. Por esta ocasião, a urbanização do
país e as reformas na Igreja já não comportavam o modelo de internato e aquele
tipo de seminário. Para ampliar o espírito caracense na educação, os padres da
Congregação da Missão fundaram no Rio de Janeiro (1959) o Colégio São Vicente
de Paulo, considerado herdeiro do Colégio do Caraça, em funcionamento até hoje.
Além do Colégio do Caraça, os padres dirigiram
colégios em Congonhas do Campo - MG (1827-1860) e em Campina Verde - MG
(1829-1983) e o Seminário de Jacuecanga - RJ (1822-1837). Dedicaram-se também
às missões populares, partindo sobretudo do Caraça e de Campina Verde.
A partir de 1850, a missão dos Padres Lazaristas se
expandiu, sobretudo pela melhora de suas relações com o Império Brasileiro.
Chegaram ao país, diversos missionários estrangeiros, principalmente franceses,
e o trabalho de formação do clero foi incrementado: muitos seminários
diocesanos passam a ser dirigidos pela Congregação, como os seminários maior e
menor de Mariana - MG (1853-1965), de Salvador - BA (1855-1862; 1888-1957), do
Rio de Janeiro (1869-1901), de Fortaleza - CE (1864-1963), de Diamantina - MG
(1866-1963), o seminário menor do Crato – CE (1875-1878) e o seminário menor de
Cuiabá – MT (1888-1945). O serviço lazarista nos seminários diocesanos foi
fundamental para a formação do clero brasileiro, ajudando a implantar as
orientações do Concílio de Trento e a conformar um novo rosto à Igreja no
Brasil.
Para a pregação de missões populares, foram fundados
diversos centros em Minas Gerais, de onde partiram equipes que missionaram inúmeras
localidades em vários Estados brasileiros. Também, os colégios e seminários
onde atuavam os Lazaristas tornaram-se centros missionários, de onde partiam
para evangelização popular.
No início do século XX, a vinda de missionários
franceses cessou. A atuação da Congregação passou a contar com o seu quadro formado
no Brasil, dedicado, especialmente à formação do clero diocesano. Novos
seminários foram a eles confiados: os Seminários de Curitiba – PR (1895-1961),
de São Luís - MA (1904-1962), de Botucatu - SP (1913-1936), de Assis – SP
(1957-1972), de Brasília - DF (1962-1971), de Luz MG (1970-1977) e da Prelazia
de Cametá – PA (1988-1995) O total de seminários diocesanos dirigidos pela
Congregação foram 19, em 12 dioceses, formando em média 2.600 padres, dos quais
156 foram sagrados bispos e seis nomeados cardeais. Na educação da juventude,
além dos colégios do Caraça e de Campina Verde, foram fundados os colégios de
Petrópolis (1897-1909), Irati (1950-2001) e Rio de Janeiro (1959).
Para a formação dos seminaristas da própria Província,
vários seminários foram fundados em períodos diversos: Caraça, Seminário de
Petrópolis – RJ (1890-1968 e 1972-1980), Escolas Apostólicas de Campina Verde,
de Irati e de Fortaleza, Seminário de Aparecida – SP (1969-1976) e, por último,
em Belo Horizonte – MG (1977), onde funciona até hoje. O Seminário Interno teve
como sede várias cidades: Caraça - MG, Petrópolis - RJ, Aparecida - SP, Bambuí
- MG, Campina Verde - MG, e atualmente acontece em Belo Horizonte – MG,
interprovincial, com abertura internacional, acolhendo seminaristas da
Argentina e anteriormente também acolheu seminaristas de Moçambique.
As missões populares permeiam toda a estada dos
Lazaristas no Brasil com conteúdo e metodologia próprios da herança vicentina.
Ainda que a partir dos anos 1960, as reformas introduzidas pelo Concílio
Vaticano II tiveram grande impacto na Província e o modelo de grandes
seminários foi questionado, bem como o modelo das missões populares. Os
seminários entraram em crise. Diversos padres deixaram a Congregação. A partir
de então, uma renovação e atualização nos métodos e na Congregação vem sendo
empreendida: na formação, assumiu-se a pedagogia libertadora; nas missões,
experiências de missões renovadas estão sendo encaminhadas; a organização interna
busca um novo modelo de vida comunitária, uma atualização administrativa e
teológico-missionária, para responder aos desafios do tempo presente.
Conforme Frencken (2010, p. 476), em 1983, estudantes
da PBCM gestaram o Encontro Nacional dos Estudantes Vicentinos (ENEV), unindo
estudantes das três províncias brasileiras. O encontro acontece anualmente e de
forma alternada entre as províncias. O primeiro se realizou em Belo Horizonte,
em 1984. O ENEV tem como objetivo a integração dos estudantes que discutem os
processos formativos e assuntos ligados à vida da Igreja, da Congregação, das
missões, da formação do clero e assuntos da sociedade a partir da realidade em
que vivem.
Atualmente, os 60 missionários Vicentinos da PBCM
continuam vivendo o carisma, servindo junto aos pobres em mais de 20 obras: paróquias
missionárias, formação dos seminaristas vicentinos e alguns serviços ao clero,
missões populares e ad gentes (Amazônia),
formação dos leigos, educação dos jovens no colégio SVP e evangelização a partir
da cultura, turismo e ecologia (Santuário do Caraça), colaboração como Família
Vicentina e promoção de serviços sociais junto aos pobres.
2.2.Congregação da Missão Província do Sul (CMPS),
Curitiba – PR.
A Congregação da Missão chegou ao sul do Brasil
juntamente com os imigrantes europeus ao final do século XIX. Conforme
Teodósio, (2019), em 1898, Dom José de Camargo Barros, o primeiro bispo de
Curitiba, solicitou à província polonesa missionários para atender aos
imigrantes poloneses. Assim, 96 padres e 03 irmãos coadjutores poloneses
chegaram ao Brasil entre 1903 a 2003, com esta finalidade. Instalaram-se
inicialmente em Tomas Coelho, Araucária - PR. A Vice Província polonesa foi
criada em 1921, tornando-se a Congregação da Missão Província do Sul em 1969,
atuante nos estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso
do Sul e São Paulo. Atuam em paróquias, missões populares ad gentes (Angola), seminários, faculdade, meios de comunicação e
nas pastorais específicas, como a Pastoral Rodoviária.
2.3.Província de Fortaleza da Congregação da Missão
(PFCM), Fortaleza – CE
A partir de 1923, a Província da Holanda começou a
enviar missionários, tendo em conta a a ação e solicitação do Padre Guilherme
Vaessen. Os missionários holandeses marcaram presença nos estados do Pará, no
Rio Grande do Norte, no Maranhão, em Pernambuco e no Ceará. Em 1967, se
constituíram numa própria autônoma, a Província de Fortaleza. Entre tantos
trabalhos significativos, vale destacar o serviço missionário na Prelazia de
Cametá - PA, onde atuaram com grande pioneirismo na defesa dos pobres, na
fundação e organização de comunidades e na formação de leigos. Hoje, a PFCM
continua sua atuação em paróquias, missões populares e ad gentes (Moçambique), educação e seminários.
3.Missionários Vicentinos que iluminaram
esses 200 anos de história
Todos os membros da CM Brasil colaboraram na
construção desses 200 anos de história, ainda que, conforme Santos (2020, p.
151-172), especialmente na PBCM, destacam-se:
1) Venerável Dom Antônio Ferreira Viçoso, 7º bispo de
Mariana, pela reforma da Igreja e formação do clero;
2) Pe. Leandro Rebelo Peixoto e Castro, CM, pelo
legado à educação durante o período imperial;
3) Pe. Guilherme Vaessen, CM, pelo incansável desbravamento
às terras de missão em lombo de animal;
4) Pe. João Chanavat, CM, pela cátedra de Direito
Canônico no Caraça;
5) Pe. Pedro Maria Bos, CM, pela ideia de colocar a
imagem de Cristo Redentor na montanha do Corcovado, Rio de Janeiro - RJ;
6) Pe. Júlio J. Clavelin, CM, pela difusão do estilo
neogótico na arquitetura sacra brasileira;
7) Pe. Manuel González, CM, pela fabricação da
primeira bola de couro cru do Brasil e introdução do futebol no país;
8) Pe. Joaquim S. Horta, CM, pelo empreendedorismo e
coordenação da campanha nacional para construção da Catedral de Brasília - DF,
construiu Santuário de São Vicente de Paulo em São Paulo - SP e Colégio de
mesmo nome do Rio de Janeiro - RJ;
9) Pe. Rui Pereira Aguiar, CM, pela aplicação da
metodologia “Mudança de Estrutura” construindo em regime de mutirão casas,
igreja, escola e posto médico nas paróquias de Taguatinga (Brasília - DF) e de
Mariápolis (Padre Bernardo – GO);
10) Pe. Hugo de Vasconcelos Paiva, CM, pela fundação e
direção do Instituto Superior de Pastoral Catequética no Rio de Janeiro – RJ,
em 1963, renovando assim a pastoral alinhada ao Concílio Vaticano II;
11) Dom Belchior Joaquim da Silva Neto, CM, que
atendendo o pedido do Pe. José Nunes Coelho, CM, levou à Roma o pedido de
criação dos Ministros da Eucaristia (MESC), posteriormente aprovado;
12) Dom José Elias Chaves, CM, pela argumentação junto
a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) pela permanente opção
preferencial pelos pobres como objetivo explícito das Diretrizes da Ação
Evangelizadora da Igreja no País;
13) Dom Helder Câmara (afiliado à Família Vicentina) e
Pe. Josimo Morais Tavares (diocesano que estudou com os Lazaristas), o
primeiro, profeta dos pobres e defensor da justiça e da paz, e o segundo,
membro da Comissão da Pastoral da Terra (CPT) e mártir da caminhada.
14) Vale destacar também a simplicidade, o espírito de
fé e de serviço dos irmãos: Eugênio Goch, CM, Vicente Melo, CM, Thomaz Glinski,
CM entre outros que doaram sua vida a Deus e aos pobres na Igreja, por meio da
Congregação.
15) Serviram à Igreja como bispos os seguintes
Missionários Vicentinos:
a) CMPS:
I.
Dom Domingos Gabriel Wisniewski, Bispo de Cornélio Procópio (PR) (1979-1983)
e de Apucarana (PR) (1983-2005);
II.
Dom Inácio Krause, Bispo auxiliar de Curitiba (PR) (1950-1963) e
Administrador Apostólico de Joinville (1955-1957);
III.
Dom Izidoro Kosinski, bispo de Três Lagoas (MS) (1981-2007);
IV.
Dom José Carlos Chacorowski, Bispo Auxiliar de São Luís (MA) (2011-2013)
e Bispo de Caraguatatuba (SP) (2013...);
V.
Dom Ladislau Biernaski, Bispo auxiliar de Curitiba (PR) (1979-2006) e
Bispo de São José dos Pinhais (PR) (2006-2012).
b) PBCM:
I.
Dom Antônio Ferreira Viçoso, Bispo de Mariana (1844-1875);
II.
Dom Antônio José dos Santos, Bispo de Assis (SP) (1930-1956);
III.
Dom Belchior Joaquim da Silva Neto, Bispo de Luz (1960-1993);
IV.
Dom Cláudio Gonçalves Ponce Leon, Bispo de Goiás (1881-1890) e de Porto
Alegre (RS) (1890-1913);
V.
Dom Fernando de Sousa Monteiro, Bispo de Vitória (ES) (1901-1916);
VI.
Dom Fernando Taddei, Bispo de Jacarezinho (PR) (1927-1940);
VII.
Dom Francisco de Paula e Silva, Bispo do São Luís (MA) (1907-1918);
VIII.
Dom João Batista Cavati, Bispo de Caratinga (MG) (1938-1956);
IX.
Dom José Afonso de Morais Torres, Bispo do Pará (1844- 1857);
X.
Dom José Carlos Melo, Bispo Auxiliar de Salvador (BA) (1991-2002) e
Arcebispo de Maceió (AL) (2002-2007);
XI.
Dom José Elias Chaves, Bispo de Cametá (PA) (1980-1999);
XII.
Dom José Lázaro Neves, Bispo de Assis (SP) (1948-1977);
XIII.
Dom Luís Gonzaga da Cunha Marelim, Bispo de Caxias (MA) (1941-1981);
XIV.
Dom Pio de Freitas, Bispo de Joinville (SC) (1929-1954);
XV.
Dom Sebastião Dias Laranjeira, CM, Diocese de São Pedro (RS) (1860 –
1888);
XVI.
Dom Vicente Zico, Arcebispo Coadjutor de Belém (PA) (1980-1989) e depois
Arcebispo titular (1990-2004).
c) PFCM:
I.
Dom Cornélio Veerman, Bispo de Cametá (PA) (1908 – 1994);
II.
Dom Evaldo Carvalho dos Santos, Bispo de Viana (MA) (2019...);
III.
Dom Fernando Barbosa dos Santos, Bispo de Tefé (AM) (2014...).
O legado dos Padres e Irmãos Lazaristas no Brasil se
deu em três frentes: a formação do clero diocesano, a pregação de missões
populares e a educação da juventude. Neste ano jubilar, a CM Brasil louva e
agradece a Deus pelos seus 200 anos e com humildade e renovado ardor
missionário continua o seguimento a Jesus Cristo fiel a missão e a caridade
comprometida com a evangelização e serviço aos mais pobres.
REFERÊNCIAS
COSTE, Pierre (org.) São
Vicente de Paulo: Obras
Completas. Trad. Getúlio Mota Crossi. Belo Horizonte: O Lutador, 2012. 2
v. (Português)
FRENCKEN, Gerardo. Em
missão: padres da Congregação da
Missão (Lazaristas), no Nordeste e no Norte do Brasil. Fortaleza:
Edições UFC, 2010.
HERRERA, José. Historia de la Congregación de la
Misión, Madrid: La Milagrosa, 1949
SANTOS, Eli Chaves dos, Congregação da Missão: 200 anos no Brasil. I. ed. – Rio de
Janeiro: Província Brasileira da Congregação da Missão, 2020.
SOUZA, Maria Rebouças de “Ir. Rosalie”. História das Filhas da Caridade
da Província do Rio de Janeiro – Brasil 1849 – 2003. Ed. Vozes,
Petrópolis – RJ, 2016.
TEODOSIO, Cleber, Pequeno Histórico sobre a Congregação da
Missão. (2019). Disponível em: <http://clefabio.blogspot.com/2019/03/pequeno-historico-sobre-congregacao-da.html> Acesso em 24 abr. 2020.
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