terça-feira, 25 de abril de 2017

ASPECTOS DA FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA


por Cleber Teodosio

A filosofia contemporânea que data do final do século XIX até os dias atuais tem como característica principal a pluralidade, trazendo como ontologia a linguagens, epistemologia, verdades; ética, valores; estética, belos e lógica, lógicas diversas, ou seja, uma filosofia que permite dizer de diferentes formas a realidade, que apresenta filosofias aplicadas e que suspeita ser a antiga filosofia um resíduo inútil da cultura ocidental. Esse novo rumo que a filosofia ganhou no século XX passou a ser denominado como virada linguística filosófica bem representada por Ludwig Wittgenstein. 

Na contemporaneidade há uma desconstrução da metafísica e uma edificação da linguagem, a filosofia tradicional diz que esse mundo não pode ser explicado por si mesmo, já a atual defende que o mundo tem tudo que precisa para explicar-se, de forma que a linguagem passa a ser o centro da filosofia e a consequência disso se deterioram os sistemas filosóficos. Tal situação fez nascer um conceito de quase verdade, cuja crítica é que essa beira a um relativismo, o que não é ceticismo. Nessa nova seara o que molda o mundo é o discurso e estudiosos passaram a utilizar como critério de verdade a sintaxe (lógica formal), a semântica (forma e objetividade), a pragmática (uso) e a hermenêutica (sentido). Por exemplo a frase “Deus é bom” é aceita pela sintaxe, porém não pela semântica. Já para a pragmática faz sentido se está dentro de um contexto. Para a hermenêutica terá sentido dependendo de quem falou ou como se a emprega. Esses quatro critérios organizam-se em duas correntes filosóficas: analítica e continental.

A filosofia analítica se caracteriza pelo uso da sintaxe e da semântica. A corrente nasceu em Viena, porém se desenvolveu na Inglaterra (Ilha), estendendo-se aos Estados Unidos. Os autores defensores da analítica são: Franz Brentano (1884), Rudolf Carnap (1932), John Searle (1977), etc., cuja lógica é técnica e prática é científica. Essa filosofia se fundamenta na lógica, ciências naturais e exatas.

Já contraria a anterior, a filosofia continental traz como características a pragmática e a hermenêutica, e teve como território inicial de atuação a Alemanha (Continente), expandindo-se para Itália, França, Espanha, etc. Seus principais desenvolvedores foram: Wilhelm Dilthey, Martin Heidegger, Jacques Derrida, etc. Os continentais abordaram uma lógica que aponta para uma filosofia de imposição humanística que considera determinante a história e pensa a lógica como arte do discurso ou disciplina do conceito, mais que do cálculo.

Diante do contexto por onde passa essa nova forma de ser do mundo, acreditou-se haver morrido a filosofia, de forma que se buscou firmar uma possível identidade para a mesma, que foi identificada como teoria (ontologia/singular – a filosofia dizia o mundo) ou terapia (Mundo plural/confusão – aqui os problemas filosóficos são os da linguagem). Antes a ciência respeitava a filosofia, agora já não, com os filósofos cada vez mais profissionalizados aparece então uma filosofia social que se organiza em tradicional ou crítica.

A teoria tradicional é uma nítida continuação da Filosofia Moderna, cujo iluminismo (filosofia) gerou uma visão social pautada no positivismo de Comte (Sociologia). Dessa vertente surge o capitalismo (economia) e dele a revolução industrial (tecnologia científica), gerando, portanto, um conceito chamado de Razão Instrumental, típica do Ciclo de Viena, cujo lema: “ordem e progresso”.

Já a teoria crítica apresenta uma filosofia contemporânea, pós-moderna, cujo marxismo (filosofia) sugere uma dialética (sociologia). O capitalismo foi revisto e criticado com a técnica, pois as relações de trabalho e vivências são outras. Surgindo assim, a razão dialógica / Comunicativa, típica da Escola de Frankfurt que defendia um caminho alternativo, diferente para o desenvolvimento social.      

O principal traço da filosofia contemporânea é a pluralidade fazendo despontar então nesse período diversas filosofias, dentre as quais vale destacar:
  • Fenomenologia – Trata da intencionalidade (conjunto de vivência e onde nada é neutro), da volta à coisa mesma, à vida factual, aqui se supera a dicotomia entre sujeito e objeto. O método (epoché) fenomenológico foi criado por Edmundo Husserl, porém também utilizado por outros filósofos: Heidegger (ser), Scheler (valor), Stein (pessoa), Hartman (símbolo), Ponty (cosmo), etc., que como Husserl tecem crítica a filosofia analítica.
  • Existencialismo – Existência concreta, sem essência ou transcendência (facticidade de existir) ou existência floreada. Organiza-se em existencialismo radical (Jean P. Sartre), cristão (John Vigton) e literário (Jean Genet).
  • Personalismo – O redescobrimento da pessoa. Aqui não dá para entender o homem apenas como sujeito. O homem é corpo, alma e espirito, cujo defensor Emmanuel Mounier.
  • Estruturalismo – Estuda o que sustenta as coisas, o que está por debaixo dos panos. A estrutura não fala mas se a ouve, não se a ver mais ela aparece, não é barreira mas limita, etc. São estruturalistas: Lévi-strauss (sociologia), Saussure (Linguística), Foucoult (Filosofia), Althusser (Marxismo), etc. estudam, portanto, o entrelaçamento entre homem e cultura.
  • Espiritualismo – Não é espiritismo, mas enfretamento ao positivismo. Apresentam a existência do espírito como elemento primordial da realidade. O homem não se reduz à natureza material, mas de espírito, valores éticos, transcendência. Defendem a corrente: Miguel de Unamuno e Edith Stein 
  • Filosofia do Diálogo – É caracterizada pela presença do outro, não como objeto, mas como outro eu. Opõe-se ao essencialismo realçando a liberdade e o significado de pessoa, nega o conhecimento científico como único cânon do saber. Defendem essa filosofia Martin Buber e Emmanuel Levinas.
  • Utilitarismo – Avalia moralmente suas ações segundo o caráter vantajoso ou não de suas consequências. Foca na justiça utilitária, na justiça possível, no que diz a lei. Essa justiça é diferente da justiça religiosa. Utilidade aqui é mais objeto, ou prática no sentido de útil. Dá-se quando uma vez estabelecido um critério prático, sendo possível agir a partir do mesmo. São referências na área Jeremy Bantham e John Stuart Mill.
  • Pragmática – Tem como pressupostos de que as teorias devem ser examinadas segundo o critério de sua aplicabilidade prática, daí a máxima: conhecimento racional e fim racional, consistindo então em um fazer pensando. Representam-no Charles Peirce e Jürgen Habermas.
  • Hermenêutica – Estuda a prática e teoria da interpretação de textos filosóficos deferente da corrente filosófica hermenêutica que reflete sobre os fundamentos das condições de possibilidades da compreensão em geral. Nessa filosofia a verdade está em toda e em nenhuma parte. São representantes dessa filosofia: Hans-George Gadamer e Paul Ricoeur.
Na contemporaneidade a linguagem tem muito peso, pois é ela que explica o homem, não o contrário. Descartes se dizia como pensamento; Freud, como subconsciente, Ponty, como corpo, hoje o homem já não se diz, mas é o que o discurso diz que ele é, ou seja, como afirma, Foucault, é o que a linguagem faz dele. Sartre nos alerta: não importa o que fizeram conosco, mas o que fazemos com aquilo que conosco fizeram. Heidegger vem afirmar que o ser mora na linguagem e Wittgenstein reconhece que a linguagem é capaz construir tantos mundos possíveis, sendo ela os limites de nosso mundo, é o autor também quem conota o mundo está doente, e cuja doença seria o excesso de linguagem, colocando então como remédio para curá-lo, o cuidado com as palavras pelo filósofo. De forma que antes a filosofia era teoria - dizia o que o mundo era, agora é terapia – tira do mundo o que ele não é, tanto que o autor sugere que não se diga o que o bom, o justo o amável... mais que se o viva!

FILOSOFIA CLÍNICA COMO ALTERNATIVA PARA O AUTOCONHECIMENTO HUMANO




Cleber Fábio Oliveira Teodosio*


RESUMO
A filosofia prática contemporânea tem sua origem na filosofia socrática da Grécia clássica. Por séculos foi deixada à margem pelos teóricos da filosofia, ressurgindo em diversos países do mundo no final do século XX como aconselhamento filosófico ou, precisamente no Brasil como Filosofia Clínica. O artigo apresenta essa filosofia como alternativa para o autoconhecimento do homem, discorre sobre seus antecedentes, conceito, método e função, e apresenta alguns efeitos práticos e positivos da Filosofia Clínica na vida humana. Pode-se dizer que a clínica filosófica é uma modalidade nova, porém de especial importância, uma vez que por meio do diálogo entre partilhante e filósofo clínico o atendimento se dá alcançando resultados satisfatórios, resgatando vidas e tornando as pessoas protagonistas de suas próprias histórias, por meio de procedimentos específicos, dentre eles o conhecimento de si.  

Palavras-chave: Filosofia. Clínica. Autoconhecimento. Humano.


INTRODUÇÃO

A prática filosófica que hoje no Brasil se denomina Filosofia Clínica tem seus antecedentes na máxima universalizada pelos filósofos socráticos, “conhece-te a ti mesmo”. No decorrer da história da filosofia tal máxima foi deixada de lado em prol da erudição teórica dos doutos, voltando à práxis filosófica apenas no final do século XX. Em 1981, o alemão Achenbach desenvolveu o aconselhamento filosófico, a ideia que se fez ecoar na França, com Sautet e sua filosofia no bar e no consultório e nos Estados Unidos com Marinoff, que como os anteriores, levou o serviço filosófico aos consultórios. Atividades do tipo ganharam espaço em outros lugares do mundo, fazendo surgir no país, na década de 1980, a filosofia supramencionada, cujo expoente Lúcio Packter.
Esse artigo traz como assunto principal a filosofia clínica como alternativa para o autoconhecimento do homem e objetiva apresentar essa filosofia como opção, para que a pessoa, perguntando sobre si, por meio do relato de sua queixa e recorrido de sua historicidade, possa, já seja pelo conhecimento de si ou por uma via singular - já que cada pessoa é única, crescer como ser humano. O texto apresenta três capítulos: O primeiro, titulado: “Os antecedentes da Filosofia Clínica”, apresenta um histórico de como essa prática filosófica se desenvolveu desde sua origem na Grécia clássica, até os dias atuais; o segundo, “Conceito, método e função da Filosofia Clínica”, procura definir essa filosofia, discorre sobre fim e metodologia, dando ênfase à prática desenvolvida, especialmente no Brasil, e como se dá a formação do filósofo clínico, e finalmente no terceiro: “Apresentar alguns efeitos práticos da Filosofia Clínica na vida humana”, traz detalhes sobre a prática da filosofia na clínica, analisa-se como se dão os procedimentos, a quem está direcionada e como ela pode colaborar para uma vida mais feliz.
Por ser uma área nova - não na sua essência, mas na sua particularidade, a filosofia clínica ainda tem poucos trabalhos realizados no Brasil, ainda que se faça necessário que mais pessoas atentem para o estudo e prática da mesma, uma vez que o número de pessoas sedentas de respostas a seus problemas existenciais, autoconhecimento e afetividade é crescente, é certo que a maior parte delas é dada pela Psicologia; entretanto é papel também da Filosofia colaborar de forma prática e efetiva na construção de uma humanidade que não se intimide em perguntar sobre essas questões.

Essa reflexão filosófica sobre o cotidiano é o que nos permite a compreensão de nós mesmos, do outro e do mundo, de maneira a direcionarmos nossas vidas e escolhas conscientemente, buscando aquilo que supomos ser o melhor caminho. (AIUB, 2004, p. 12)


Estudiosos que defendem a praticidade na Filosofia, como Sautet (2000), não descartam ciências como a Psicologia na intervenção de problemas ligados a vida do homem, porém reconhece a Filosofia como lugar privilegiado para que as pessoas possam lidar com suas angústias, discutir seus dilemas frente à realidade atual,

Se o mal-estar do paciente tem origem em seu psiquismo, nada mais normal do que consultar um terapeuta. [...] Mas, e quando não é o sujeito que está em causa e sim a cidade, ou a nação, ou o Estado, ou os Estados ou nações, unidos ou desunidos, ou a espécie humana em seu conjunto? Pergunto: qual é a legitimidade de intervenção do terapeuta quando o mal-estar da pessoa que vai consulta-lo provém de uma situação geral defeituosa? Se alguém deve intervir, não será, antes... o filósofo? (SAUTET, 2000, p. 12)


Muitos são os meios pelos quais o homem pode ascender a respostas acerca do mundo, da vida e sobre si mesmo. A Filosofia Clínica é uma das alternativas, sua ação em prol do protagonismo do sujeito a aproxima das ideias defendidas por Sartre, na obra “O Existencialismo é o um Humanismo”, onde o mesmo discorre sobre o homem autônomo, livre, que se faz, supera-se e se realiza. Segundo ele:

O homem está constantemente fora de si mesmo, é projetando-se e perdendo-se fora de si que ele faz existir o homem e, por outro lado, é perseguindo fins transcendentes que ele pode existir; sendo o homem essa superação e não se apoderando de objetos senão a referência a esta superação, ele vive no coração, no centro dessa superação. Não há outro universo senão o universo humano, o universo da subjetividade humana. (SARTRE, 1973, p. 27)

Desta forma a Filosofia Clínica colabora para que o homem perguntando sobre a sua própria história, encontre em sua subjetividade o modo de superar suas inquietudes, ou seja a partir do autoconhecimento o homem é capaz de realizar seu auto crescimento.
A pesquisa quanto ao seu método foi descritiva e explicativa, pois se buscou descrever e explicar a definição de Filosofia Clínica e discorrer sobre sua aplicação junto a seus partilhantes. A fonte de dados foi bibliográfica e para seleção do material foi realizada pesquisa em meio eletrônico, em bancos de dados de teses, dissertações e monografias através do uso das palavras-chaves que aludem ao título. O trabalho foi árduo mais os resultados satisfatórios, pois reúne aqui uma visão geral da Filosofia Clínica na ótica do autoconhecimento.


1 OS ANTECEDENTES DA FILOSOFIA CLÍNICA

O uso de pensamentos ou teorias filosóficas com o fim de promover o autoconhecimento humano, caminho imprescindível para o indivíduo resolver seus conflitos, problemas ou crises existenciais, é uma realidade nova e antiga, em diversas partes do mundo. Antiga porque, na sua origem, a Filosofia era instrumento de organização das cidades, com lugar privilegiado na política ou nos costumes dos cidadãos gregos. Nova porque, expandindo-se pelo ocidente, a Filosofia ficou muito presa à teoria dos doutos, aos muros da academia, retomando seu viés mais prático apenas no final do século XX. Segundo Pechula (2007), esses autores atuam libertando a Filosofia da mera produção intelectual, voltada a poucos, e democratizando-a, possibilitando assim sua utilização prática e, portanto, o retorno à sua verdadeira origem, quando inicialmente se perguntava sobre o mundo e sobre o lugar do homem nele, e logo com Sócrates, como a humanidade deve viver sua vida (BUCKINGHAM, 2011).
Muitos são os meios pelos quais o homem pode ascender a respostas acerca do mundo, da vida e sobre si mesmo. A Filosofia Clínica é uma das alternativas, apesar de, aparentemente, apresentar-se como uma atividade nova para o fim, uma vez que apenas em 1990, é implantada, no sul do Brasil, esse novo uso sistemático dos conhecimentos filosóficos, que se volta para a autoconstrução do homem, dá praticidade à Filosofia e é despertado seu valor terapêutico. Isso está presente desde sua época clássica, quando Sócrates, por meio da maiêutica e da máxima “conhece-te a ti mesmo” (BUCKINGHAM, 2011, p. 49), estimulava seus convivas a buscarem em si próprios, luzes rumo à solução de seus entraves pessoais e, por extensão, sociais.
Em alguns momentos da história da humanidade, especialmente na Idade Média, “ouvimos piadas zombando do filósofo como o erudito cuja sabedoria não serve para nada” (AIUB, 2004, p. 13). Hoje, já não se pode admitir tais comentários, uma vez que a reflexão filosófica, isenta de visões dogmáticas, com métodos, tem permitido ao homem o pensar e o agir de forma organizada, favorecendo uma visualização clara das situações do seu dia a dia, e, consequentemente, uma escolha avaliada, refletida e com um maior grau de segurança.
Dentre outros, antecedem Packter nesse viés prático da filosofia, o filósofo alemão Gerd B. Achenbach em 1981, que conforme Gomes (2016), a desenvolve a partir da concepção epicurista como terapia da alma. De forma que aconselhamento filosófico é entendido como uma proposta para resolver questões típicas da psicoterapia.
Depois tem-se na França, Sautet (2000) que, com sua aplicação da filosofia no bar e no consultório, não descarta o uso de ciências na resolução de problemas ligados à vida do homem, porém reconhece a Filosofia como espaço singular para que as pessoas possam lidar com suas angústias, discutir seus dilemas frente à realidade atual, já que àquela se faz mais eficaz unida a outros saberes.
Nos Estados Unidos tem-se Marinoff, que criou no início dos anos 1990, uma "prática filosófica" similar as relatadas anteriormente, visto que pretende apresentar uma filosofia a serviço da vida. Segundo Pechula (2007), sua intervenção é conhecida por aconselhamento filosófico e, como as anteriores, consiste na abertura de um consultório com objetivo de atender pessoas que necessitam de orientação ou ajuda para lidar com os problemas que aludem a questões como relacionamentos amorosos, atitudes éticas, relação com a morte, mudanças profissionais, procura de sentidos, etc. O mesmo escreveu uma obra Mais Platão, Menos Prozac, onde afirma que de posse dos conhecimentos do livro o leitor conseguirá realizar um auto aconselhamento, bem como, que a ida ao consultório do filósofo, mais que uma terapia convencional, onde se indica remédio (psiquiatria, por exemplo), o sujeito busca discutir acerca do que o aflige e encontra ali uma ajuda eficiente.
No Brasil a forma em questão, de trabalhar a filosofia, é proposta pelo médico gaúcho, Lúcio Packter. Na obra Filosofia Clínica - Propedêutica, Packter (2001) afirma que iniciou sua investigação para a criação de um trabalho curativo apoiado na filosofia, cujo objetivo era aplica-la a questões relacionadas ao cotidiano das pessoas. Segundo ele (p. 11), trata-se da "utilização da filosofia aplicada ao indivíduo", ajudando-o a reconhecer suas limitações e a buscar soluções. Denomina seu trabalho de Filosofia Clínica.
Ao apresentar a obra supramencionada, o autor faz uma retrospectiva da década de 80 - época em que começa a desenvolver essa filosofia, revelando fatos que lhe causaram tristezas e incertezas, mas também alegrias. Triste era recordar do sofrimento e dificuldade em associar os lugares e as pessoas que havia conhecido tempos atrás na Argentina, derrotada pela guerra travada contra as Ilhas Malvinas em 1982. Às incertezas discorre sobre o crescimento do Partido dos Trabalhadores, apontando que antes de 1989 pareceu ter ocorrido um encontro entre todas as esquerdas do Brasil, porém via com incerteza essa abertura política, e que demorou entender como era viver o momento sem medo. Já as alegrias ele reservou para a comoção de ver, ainda que a distância, a queda do muro de Berlim. Catalogou assim a década de 80, como um período “de alívio, de choro e de amor. Uma década surpreendente” (PACKTER, 2001, p. 9). Tais acontecimentos o motivaram na implementação do seu trabalho filosófico no Estado de Santa Catarina.
Vários são os filósofos que no decorrer da história trataram conhecimento de si. Inicialmente, segundo Jopling (2000), há os filósofos da antiguidade, com Sócrates por meio de Platão, que viam o autoconhecimento como algo bom por si ou por fins práticos. Seguido por autores como Agostinho e Rousseau. Logo se tem os que veem o autoconhecimento como algo moralmente valioso, mas difícil de ser alcançado por causa da natureza indizível do sujeito, cujo um dos defensores é Nietzsche, em alguns momentos. Por último, os que veem o autoconhecimento como uma autocrítica, cujos principais nomes Espinoza, Freud, Heidegger, Sartre e Morin.
E continua Jopling (2000) apontando que o autoconhecimento em filosofia é um objeto de investigação epistemológica ou é a finalidade de uma busca de natureza ética. No primeiro caso o que se busca é uma explicação de como e o que é conhecido. Aqui o sujeito tem acesso privilegiado aos próprios pensamentos, ou seja, conhece seus pensamentos de uma maneira que os outros usualmente não conhecem; no segundo, a realização de algo que leve o indivíduo ser dono de si mesmo e, consequentemente, ser uma pessoa melhor, nesse caso, autoconhecimento é uma realização, ao invés de algo dado ou prontamente disponível ao sujeito. Para conhecer-se a si mesmo, a pessoa precisa refletir, e interpretar a si mesmo.


2 CONCEITO, MÉTODO E FUNÇÃO DA FILOSOFIA CLÍNICA

Desde seu surgimento na Grécia, no século V a.C., a filosofia tem sido dita sem uma significação concluída até os nossos dias, uma vez que as definições são, normalmente, polêmicas, de forma que a melhor maneira de conceituar filosofia é vivê-la. Aiub (2004) reúne diversas concepções do termo filosofia, numa pesquisa que evoca Platão, Aristóteles, Saviani, Jaeger etc., mesmo assim, não fecha o conceito, porém, analisando o material por ela reunido, é visível a permanência da ideia de reflexão fundamentada, que implica no uso do saber em benefício do homem.
Packter define a Filosofia Clínica como “a filosofia acadêmica direcionada à clínica, realizada unicamente por filósofos formados em faculdades reconhecidas pelo Ministério da Educação” (PACKTER, 2001, p. 11).
Dentro de uma perspectiva da clínica, segundo Aiub (2004), a filosofia pode ser entendida como uma atitude de reflexão sistemática, fundamentada e contextualizada sobre as questões que surgem no cotidiano. O que se apoia no conhecimento acumulado pela humanidade, cuja finalidade é encontrar formas plausíveis para lidar com os problemas, e favorecer uma compreensão mais precisa de nossas vidas.

Pela íntima relação, no surgimento entre medicina e filosofia; pela função da filosofia em suas origens - encontrar a virtude da alma e do corpo, o equilíbrio do ser tanto na dieta, nos exercícios nos hábitos, quanto nas ações e emoções; pela noção de equilíbrio que considera as circunstancias e a individualidade, destaca-se o papel terapêutico e profilático da filosofia. (AIUB, 2004, p. 25)


Dessa forma a Filosofia Clínica também pode ser aplicada como uma medida que visa prevenir seus clientes de situações-problema que podem ocasionar doenças, ou seja, como as demais medidas profiláticas, pode ser utilizada com o intuito de impedir ou reduzir o risco de problemas ligados à existência, alertando os clientes da ocorrência ou da evolução de um fenômeno nocivo a sua vida, e o faz, segundo Aiub (2014), buscando o equilíbrio do todo, através da compreensão desse e da inter-relação de suas partes: corpo, alma, natureza e sociedade, que uma vez em harmonia, promove o bem-estar geral.
Packter (2001) afirma que em muitos aspectos a Filosofia Clínica se diferencia da Medicina Psiquiátrica, mas que a Filosofia é pai e mãe dessa das demais ciências, e que como pai rígido crítica e também se deixa criticar, porém o autor reconhece que mais que tudo, a harmonia e a intercessão entre ambos tem se mostrado rapidamente positivo.
Ainda ao discorrer sobre o tipo de filosofia desenvolvido por Lúcio Packter, Aiub atesta que:
Considerando que a Filosofia Clínica mantém a proposta original da filosofia de conhecer o todo, através dos Exames Categoriais, e a individualidade, ao apresentar um método flexível o suficiente para adaptar-se as características individuais de seu partilhante, e observada as Estruturas de Pensamento e no uso dos Submodos Informais a Filosofia Clínica é filosofia e possui um caráter terapêutico. (AIUB, 2004, p. 26)

A terminologia clínica é compreendida tal como o propõe Foucault (2004), que muda a perspectiva, ou seja, focaliza a pessoa e não a doença. A filosofia clínica enfatiza o indivíduo por seu relato, contexto, vivência, representação, não a sua tipologia patologia, favorecendo então um espaço para o filosofar, por colocar o partilhante[1] no centro, enxergando-o como um universo singular que necessita respeito e auxílio; não focando o problema, mas sim, o sujeito, beirando assim a um humanismo.
Desta forma a Filosofia Clínica colabora para que o homem pergunte sobre a sua própria história, encontre em sua subjetividade o modo de superar suas inquietudes, ou seja, a partir do autoconhecimento, ajuda o homem a ser capaz de realizar sua autoconstrução.
Em Filosofia Clínica “não há um único método, mas a junção de vários deles” (AIUB, 2004, p. 111) estruturando-se em: primeiro contato, historicidade, exames categoriais, estrutura de pensamento e submodos A fundamentação teórica e método abrangem o “logicismo formal associado ao empirismo inglês e à analítica da linguagem (filosofia da linguagem), historicidade e fenomenologia. Por último, matemática simbólica” (PACKTER, 2001, p. 88).
Segundo Packter (2001), a Filosofia Clínica tem como característica o uso de escritos filosóficos, quase que exclusivamente e apoia-se nas teorias e autores da própria Filosofia, bem como a ausência de tipologias e de critérios médicos como normal X patológicos. Na clínica não se utiliza medicamentos nem drogas, mas o que se faz, após a localização existencial da pessoa, é estudar a estrutura de pensamento da pessoa com a mesma, e de seus respectivos submodos informais associados. A última ação do filósofo clínico é a aplicação direta e continuada de submodos construídos a partir da realidade da pessoa.
Packter (2001) também afirma que o tratamento clínico tende a se efetivar entre 6 e 10 meses, com atendimentos máximos de dois encontros semanais de 50 minutos. E salienta que o filósofo clínico não tem habilitação e nem autoridade legal para atender a pessoa com estruturação tal que sejam impedidas do exercício livre de sua cidadania, requerendo interdição hospitalar, etc. Bem como que o atendimento pode ser feito em locais distintos, não se limitando as paredes do consultório.
Por meio do trabalho do filósofo clínico munido de afeto terno, escuta atenta, acolhida empática, relação respeitosa e aplicação da metodologia própria[2] a filosofia clínica cumpre a função de colaborar na solução de problemas do dia a dia das pessoas.
Inicialmente, no consultório, Packter quis orientar os partilhantes a encontrarem na literatura filosófica a resposta para suas crises, porém percebeu que sua intervenção terminava por influenciar nos relatos de seus clientes, passando então a exercitar o ouvido, fazendo o mínimo possível de agendamentos[3], enquanto ouvia as histórias partilhadas, só depois procurava auxiliá-los na resolução. De sua experiência elaborou diversos materiais que são referência para a prática da filosofia clínica no país e no exterior. Sobre a atividade Aiub explica que o profissional dessa área deve respeitar o modo de ser, agir e pensar de seu partilhante:

O filósofo clínico é aquele com quem a pessoa partilha sua vida, suas questões, é um profissional apto a pensar junto com a pessoa, sem interferir em suas decisões, mas auxiliando-a a refletir sobre si mesma e sobre o mundo que a rodeia, levantando, com ela, opções, outras possibilidades para lidar com suas questões cotidianas. (AIUB, 2004, p. 15)

A preocupação de Lúcio Packter em exercer um serviço eficiente o motivou o Instituto Packter, onde atende seus clientes, bem como oferece formação profissional à pessoas interessadas na filosofia por ele desenvolvida, como Curso de Especialização em Filosofia Clínica, organizado, segundo Packter (2001, p. 85) da seguinte maneira: a) “mínimo de 15 meses de aulas com um filósofo clínico formado”; b) onde o aluno recebe 18 apostilas (cadernos das letras A ao R) Editora AGE; c) realizam pré-estágio com um filósofo clínico instrutor, com quem o aluno faz os exames das categorias; d) aulas de argila e escultura, pintura, línguas, palestras, grupo de pesquisas de submodos, estudos de filmes e atividades de caráter facultativo, fazem parte do curso; e) após o nono mês de aula, clinica um colega e é clinicado por outro, tanto aqui como no pré-estágio as ações são gravas e transcritas, e material entregue ao cliente, invariavelmente. Salienta-se ainda que conforme seja o instrutor, pode permitir que o aluno atenda um ou dois clientes, sob sua supervisão. Por fim, Packter esclarece que ao término das aulas e convivência o aluno recebe o Certificado A (apto à clínica e a pesquisa) ou B (apto à pesquisa). Uma vez formado, o aluno inscreve-se no Conselho Regional de Filosofia Clínica e recebe a carteira do CRFC. Dessa forma poderá desenvolver a filosofia clínica no seu fazer profissional.


3 ALGUNS EFEITOS PRÁTICOS DA FILOSOFIA CLÍNICA NA VIDA HUMANA

A Filosofia Clínica favorece o autoconhecimento a fim de que a pessoa encontre em si mesmas respostas para os males que lhe acarreta. Sendo então a Filosofia Clínica uma alternativa plausível para a pessoa que não se sente cômoda com terapias convencionais, uma vez que o atendimento clínico pode se “em qualquer local: consultório, jardins, cantinas, escolas. Não há limitação para isso” (PACKTER, 2001, p. 88), o que termina sendo uma facilidade para o partilhante.
O partilhante que busca o serviço do filósofo clínico terá resposta de um profissional capacitado para atendê-lo, uma vez que esse age segundo um código de ética, e está devidamente registrado no Conselho Regional de Filosofia Clínica que lhe fornece uma carteira/código habilitando-o a desenvolver a profissão, isso porém não o autoriza, diante de uma primeira informação dada pelo partilhante, fazer conclusões ou aconselhamentos apressados, mas a fomentar que essa fale mais sobre o assunto em questão a fim de que a partir dessa explicação, ele próprio clareie suas ideias e perceba o que realmente a aflige (BORTOLIN, 2011).
É bem verdade que o labor clínico parte da historicidade do partilhante, tendo então o cliente a oportunidade de relatar com confiança o que lhe acomete. Ciente de que para algumas pessoas falar sobre a própria vida não é fácil, e ainda considerando o caso de crianças, pessoas com deficiência ou outras limitações o partilhante pode ir ao consultório acompanhado dos pais ou responsáveis, ou expressar sobre si por outras vias:

Há ocasiões em que a pessoa se expressa de modo precário verbalmente se compararmos sua expressão quando desenha, toca um instrumento de cordas, dança ou cozinha; o filósofo vai ao encontro dos dados de simiose da pessoa; isso quer dizer que o filósofo procurará desenvolver sua clínica utilizando os dados de expressão mais acessíveis e ricos de que a pessoa propuser. Por isso, além das disciplinas como Filosofia da Arte, História, Sociologia, Filosofia da Linguagem – dadas na faculdade de Filosofia -, os filósofos clínicos ainda estudam argila e escultura, línguas, cinema, pintura e somaticidade no Instituto Packter. (PACKTER, 2001 p. 31)

Dessa forma é incorreto afirmar que a Filosofia Clínica seja indicada somente a pessoa que tenham problema de saúde, ao contrário, essa é inclusiva e pode servir a diferentes situações da vida das pessoas. Segundo Bortolin (2011, s. p.), “as indicações são amplas e vão desde quem passa por uma crise ou tem dificuldade em lidar com perdas até quem apresenta problemas somáticos derivados de questões mal resolvidas”. Ainda segundo o autor, “o acompanhamento de um filósofo clínico pode, por exemplo, ajudar adolescentes que querem decidir a profissão ou pessoas que se interessam em conhecer a si mesmas” (BORTOLIN, 2011, s. p.).
Conhecer os vários filósofos ou haver lido obras filosóficas não deve ser uma preocupação da pessoa que deseja procurar os serviços de um filósofo clínico. Sobre o tema, Bortolin (2011, s. p.) vem afirmar que “a eficiência das sessões não depende de conhecer a Filosofia profundamente e, em geral, os profissionais sequer citam os filósofos durante as conversas”, o que a pessoa pode e deve fazer é abrir-se ao processo de autoconhecimento, por exemplo, a fim de que com o diálogo e a clínica oferecida pelo profissional possa descobrir por si mesma ou em interseção com esse, uma saída rumo a liberação daquilo que a incomoda.
Como apontado, esse artigo traz em sua temática o autoconhecimento realizado na clínica como alternativa para autoconstrução do ser humano, porém é válido perguntar se o conhecimento de si é indicado a todas as pessoas, uma vez que o caminho mais prático que utiliza o filósofo clínico para ajudar o partilhante chegar a tal, é ouvir a história de vida do cliente contada por esse, já que, como afirma Packter (2001, p. 31), “há casos em que um exame autobiográfico superficial é simplesmente insuportável à pessoa devido ao modo como ela é”, deixando margem a dúvida se o autoconhecimento, ao invés de solução pode se tornar um problema para a pessoa.
Sobre a questão defendeu Aiub (2012) que um dos princípios fundamentais da filosofia clínica é a singularidade. Segundo a autora, há pessoas para as quais “conhecer a si mesmo” é fundamental, já para outras, há riscos; e para terceiras, é algo que nem se deve pensar.
O “conhecer-se a si mesmo” em filosofia clínica pode aparecer em diferentes momentos do trabalho clínico. Para Aiub (2012), se o assunto[4] for “conhecer a si mesma”, o primeiro passo é compreender o que isso significa, para aquela pessoa. Já que para alguns, segundo a autora, pode significar encontrar os seus porquês de ser e agir; para outros, conhecer seu próprio corpo; outros ainda podem considerar conhecer a sociedade onde vivem, etc. No caso de que esse, definitivamente, não seja o assunto, Aiub atesta ainda haver a possibilidade de abordá-lo em quatro outras situações: a) dado padrão, observável na historicidade da pessoa; b) dado atualizado, o que significa ser uma questão atual para a pessoa, c) submodo, um procedimento indicado, necessário para que a pessoa possa lidar com suas questões, e d) estrutura de pensamento - tópico 2. “O que acha de si mesmo”. Concluído Aiub (2012, s. p.) não haver “a defesa do autoconhecimento como algo desejável a todas as pessoas, nem como um princípio clínico, muito menos como indicado para todos os casos”.
A dúvida parece persistir se o “conhece-te a ti mesmo” socrático-platônico pode ser contraindicado em clínica. Uma saída, portanto, pode ser tentar, inicialmente, compreender o significado da expressão. Foucault (2010) por exemplo, declara que os filósofos socráticos, a utilizavam com o significado de conhecer para o autocuidado, e cuidar de si denotava cuidar da polis. Já hoje, segundo Aiub (2012), muitos defendem o “conhece-te a ti mesmo” numa perspectiva individualista, desconectada das necessidades do outro.
Mais que o anterior, legitimidade ou não da aplicação do autoconhecimento em Filosofia Clínica se tornará mais clara com a explanação do seguinte caso: Consideremos um educador exercendo seu papel na realidade brasileira, que busca o conhecimento de si e do mundo que o rodeia como elemento fundamental para sua atuação.


Sempre que nos reunimos com professores para abordar tais questões (...) são comuns as alusões às dificuldades cotidianas do professor, cansado, com excesso de alunos e de aulas, má remuneração, cobranças burocráticas, programas e teorias previamente determinados, que impedem a autonomia e o livre pensar, etc. Em outras palavras, são comuns as queixas sobre a quase impossibilidade em se desenvolver um trabalho efetivo na maior parte das vezes. (AIUB, 2012, s. p.)

Aiub (2012) segue esclarecendo que uma vez ouvidas as queixas de tal educador o filósofo clínico pôde identificar que esse vivia em seu labor imergido em estruturas rígidas e que essas podem mudar-se em flexíveis para uma melhor vivência, aprendizagem dos alunos e efetividade de seu trabalho, de forma que recorre a alguns filósofos que leem tais estruturas e tenta rompê-la, um exemplo deles é Michel Foucault, que analisa a estrutura da biopolítica, que parece dá total liberdade, quando na verdade traçam, pelo que ele chama de processo de “normatização”, as formas na maioria das vezes impostas para conduzir o modo de existência do homem.

Em contraposição a esta forma de gerir as condutas das populações, Foucault propõe a construção de uma contraconduta, pautada no conhecimento de si e do mundo circundante, ou seja, para conseguir construir uma contraconduta, para não ser conduzido desta forma, é preciso que cada cidadão tenha conhecimento das estruturas nas quais se encontra, para que consiga identificar os elementos, as formas de articulação e as brechas para a construção de contracondutas. Neste sentido, o conhecer a si mesmo é conhecer a polis, ou seja, conhecer as estruturas sociais nas quais se insere, é conhecer para cuidar, conhecer para governar. (AIUB, 2012, s. p.)

Dessa forma Aiub (2012) concluiu que se o educador considerar seu papel como o de um reprodutor de conteúdos, certamente não necessita conhecer o mundo a sua volta; muito menos a si mesmo; e talvez seja até perca tempo, preocupar-se em conhecer seus educandos. Porém, se ele considerar a construção dos saberes como construção de modos de vida e estiver preocupado com a existência; o conhecimento, de si, do mundo e do outro será imprescindível à sua prática.
Diante do caso podemos afirmar que autoconhecimento é válido na clínica e pode colaborar para autoconstrução do homem, do outro e da sociedade em que o partilhante vive, porém mais que o conhecimento de si, importa o que o cliente vai fazer com esse conhecimento, caso esteja comprometido com a mudança a ferramenta será eficaz e a transformação da sua vida e de seu entono será feliz e vibrante. Percebe-se assim que o sucesso do fazer clínico exige tanto da eficiência do trabalho do filósofo quanto do desejo de mudança do partilhante transformado em realização, dessa forma, o resultado não poderá ser outro, senão uma resposta positiva, para ambos, porém com especial ganho, para o partilhante.




CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao abordar a clínica filosófica como alternativa para o autoconhecimento do homem, o texto procurou apresentar esse novo movimento da filosofia contemporânea como opção para que pessoas acometidas de queixas diversas ou especialmente acerca da vida por sua relação com o mundo, o outro ou consigo mesmo, possa amadurecer como ser humano.
Nos três pontos apresenta, viu-se no primeiro, cujo título: “Os antecedentes da Filosofia Clínica” um apanhado histórico da prática filosófica que teve sua origem na filosofia antiga, passando por um período sem destaque no âmbito filosófico, sendo retomado apenas no final do século XX; no segundo, “Conceito, método e função da Filosofia Clínica”, definiu-se, Filosofia Clínica, discorreu-se sobre a finalidade da mesma, bem como sobre o seu método, nesse ponto esclarece-se ainda os passos pelos quais o candidato deve passar a fim de que possa tornar-se um filósofo clínico competente, com conhecimentos e direitos legais para aplicar profissionalmente essa filosofia; no último ponto: “Apresentar alguns efeitos práticos da Filosofia Clínica na vida humana”, é mostrado como a filosofia na clínica se dá na prática, a quem ela é dirigida, onde pode se dá e quais são os benefícios da mesma na vida daqueles que a buscam.
O texto, apesar de já trazer bastante informações, em momento nenhum esgota todo o assunto entorno da filosofia clínica, pois a mesma apesar de nova tem diversos cursos em abertos e materiais publicados em diferentes regiões do Brasil e do mundo, ainda que de difícil acesso, certamente pelo preconceito da parte dos que ignoram os benefícios da filosofia em questão, que pouco a pouco vem sendo superado. Packter, na apresentação do livro “Filosofia Clinica: propedêutica” aponta a criação de um tratado sobre a filosofia clínica, o que permitirá um melhor conhecimento sobre o tema.
O aconselhamento filosófico ou a filosofia clínica devolveu a Filosofia sua praticidade permitindo que por meio do diálogo, da interseção e relação entre filósofo clínico e partilhante seja construído uma ação capaz de transformar vidas, atuando desde a prevenção de problemas, resolução de angustias, até importantes tomadas de decisões que darão um novo impulso na vida daqueles que por meio do autoconhecimento, da abertura ao processo clínico e da vontade de fazer um mundo melhor, permitem-se com base nos procedimentos da filosofia clínica alçar passos significativos rumo a uma vida ousada, comprometida com o bem e mais feliz.


ABSTRACT
The contemporary pratic philosophy has your origin in the socratic philosophy of Classic Greek. For centuries was left at margin by philosophy theoreticals, resurgin in many countries of the world in the end of the XX Century how Philosophy Counseling or, just in Brazil how Clinic Philosophy. The article shows this philosophy how an alternative to the self-knowledge of the man, and talks about your background, concept, method and function and presenting some pratic effects and positives of the Clinic Philosophy in the human life. It's possible to say that the clinic philosophy is a new model, but of an especial importance, one time that by the way of the dialogue between sharer and clinic philosopher the attendance gives satisfactory results, rescuing lives and becoming people protagonists of their own stories by the way of specific procedures among them the knowledge of yourself.

Keywords: Philosophy. Clinic. Self-knowledge. Human.


REFERÊNCIAS

AIUB, Monica. O educador e o autoconhecimento. Uol Vyaestelar, São Paulo, 2012. Disponível em: Acesso em: 03 set. 2016.

AIUB, Mônica. Para entender Filosofia Clínica: o apaixonante exercício do filosofar. Rio de Janeiro: WAK, 2004.

BORTOLIN, Rafaela. Terapia feita com filósofos. Gazeta do povo, Curitiba, 2011. Disponível em: Acesso em: 05 set. 2016.

BUCKINGHAM, will. O livro da filosofia. Tradução de Douglas Kim. São Paulo: Globo, 2011

FOUCAULT, Michel. A hermenêutica do sujeito. São Paulo: Martins Fontes, 2010.

___________ O nascimento da clínica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1994.

GOMES, Manoel Vasconcellos. Filosofia e Clínica. Atelier Dasein, Rio de Janeiro, 2016. Disponível em: . Acesso em 02 set. 2016

JOPLING, David A. Self-Knowledge and the Self. New York: Routledge, 2000.

PACKTER, Lúcio. Filosofia clínica: propedêutica. 3. ed. Florianópolis: Guarapuvu, 2001.

PECHULA, Marli Aparecida. A filosofia e seus usos: crítica e acomodação. 84f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Estatual de Campinas, Campinas, 2007.

SAUTET, Marc. Um café para Sócrates. Tradução de Vera Ribeiro. 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2000.





* Bacharelando de Filosofia na Faculdade Vicentina. Contato: clefabio@gmail.com
[1] Pessoa que procura o filósofo clínico, que partilha suas questões, cliente (AIUB, 2004, p. 136).
[2] Não há um único método, mas a junção de vários deles, estruturando-se em: primeiro contato, historicidade, exames categoriais, estrutura de pensamento e submodos (AIUB, 2004, p. 111).
[3] Interferência feita pelo filósofo clínico durante os procedimentos (AIUB, 2004, p. 135).
[4] "Assunto imediato": a questão que levou a pessoa a procurar pelo filósofo clínico, e "assunto último" – a questão que será trabalhada em clínica e que tanto pode coincidir com a questão imediata, como não (AIUB, 2004, p. 66).

terça-feira, 18 de abril de 2017

MISSÃO DE SEMANA SANTA EM IMBITUVA – PR


A semana santa é o momento mais forte do cristianismo católico apostólico romano, que tem como base a festa de todas as festas, a Páscoa do Senhor, quando se faz memória da Paixão e Ressurreição de Jesus Cristo. A cada ano, nesse período ocorrem em diferentes lugares do mundo missões, realizadas inclusive por estudantes em período de formação para o ministério ordenado. O Seminário Interprovincial de Filosofia Nossa Senhora das Graças de Curitiba – PR aderiu a causa e enviou para quatro paróquias do Estado, seus 22 seminaristas, a saber: Colônia São Pedro II, Imbituva, Prudentópolis e São Gerônimo da Serra.

Uma vez nas paróquias os enviados foram alocados em comunidades diversas. Os que foram à paróquia Santo Antônio de Imbituva estiveram organizados da seguinte forma: Alexandro serviu na comunidade de Lontrão; Cleber, Vila Zezo; Michel, Jardim Esperança, Mildenberg e Mateus, Valinhos, e Noel, Tangará.

Ademais das atividades próprias do tríduo pascal, os missionários acompanharam os padres vicentinos daquela paróquia – Eder, Gilson, Leopoldo e Pedro em diferentes comunidades no sábado e no domingo de ramos, bem como, de segunda a quarta-feira santas visitaram escolas, asilos, rádios e famílias onde ministraram bênção, anunciaram a Palavra e falaram sobre páscoa e vocações. Três deles, que ficaram na sede do município, participaram com os padres, da missa da unidade na Catedral Nossa Senhora Santana em Ponta Grosa – PR.

A missão foi um tempo forte de formação e fortalecimento vocacional para os estudantes, que se empenharam em praticar o estudado no seminário. O povo também se alegrou com a presença dos seminaristas nas comunidades, oportunidade de aprender e também ensinar. A troca de experiência foi salutar e benéfica para ambos os lados. A missão terminou, mas a luta continua, testemunhar o ressuscitado é o legado por essa deixado. Assim, povo e missionários voltando às suas galileias levam impressos em seus pensamentos palavras e gestos a certeza de que Ele vive.  

sexta-feira, 7 de abril de 2017

Complexo Santuário do Caraça - MG Brasil


Parafraseando Dom Pedro II, “só a ida ao Caraça, valeu a pena a viagem a Minas Gerais”, assim que não apenas nós, mas todos os apaixonados por história, natureza, tranquilidade, comida boa e paz de espírito podem ir ao local e desfrutar das maravilhas que o Complexo Santuário do Caraça encerra. 

Eu já tive a sorte de estar no Caraça algumas vezes, cada retorno renova-se em mim planos de futuras visitas ao mesmo. O complexo, pertencente à Província Brasileira da Congregação da Missão (PBCM), o local leva esse nome pelo fato de reunir nos 11.233 hectares da Reserva Particular do Patrimônio Natural (IBAMA Portaria 32/96-N) um centro de espiritualidade e missão, cultura e educação, conservação e preservação ambiental de lazer e turismo somado às sugestões de atividades que o lugar oferece.

O Santuário localiza-se há 120 km da capital mineira Belo Horizonte, e já conta com mais de 240 anos de história, iniciada em 1768 quando Irmão Lourenço de Nossa Senhora - membro da Ordem Terceira de São Francisco, adquiriu a sesmaria do Caraça construiu ali uma ermida dedicada a Nossa Senhora Mãe dos Homens. Ir. Lourenço faleceu em 1819 com o sonho de que o Caraça se tornasse uma Casa de Missão, desejo esse implícito no testamento onde também entregava todos os seus bens a D. João VI, rei de Portugal, que por desígnios da Providência, em 1820, entregou a herança aos padres da Congregação da Missão, recém-chegados ao Brasil, Leandro Castro e Antônio Viçoso*. Uma vez no local os missionários abriram um colégio com a ajuda do noviço João Garcez, que se tornaria o primeiro padre da CM do Brasil, logo ali foi instalado um seminário (1863), mas com o incêndio que sofreu em 1968, o local foi reaberto como Centro de Peregrinação, Cultura e Turismo, tal como segue hoje.    

A atual estrutura foi sendo construída pouco a pouco no decorrer de todos esses anos, um destaque especial para o presente Templo do Complexo que substituiu a ermida. Em 1880, Pe. Jules Clavelin, CM começou sua construção, que traz um estilo gótico, e conserva dois altares da capela anterior localizados à direita e à esquerda de quem entra na igreja, seu pátio externo  ocupa o lugar do antigo cemitério, passando os mortos a serem enterrados nas catacumbas debaixo da igreja; a torre tem 48 metros de altura construída de pedra tirada do Caraça; os sinos de até 180 kg datam de 1792; a imagem de Nossa Senhora das Graças no dorso frontal da torre foi colocada em 1880, 50 anos das aparições da Santíssima Virgem em Paris - França; as mãos cruzadas aludem a irmandade franciscana de Ir. Lourenço; a cruz no alto da torre traz uma relíquia da cruz de Cristo, o relógio tem mecanismo sofisticado. Vale salientar ainda que o altar principal sobrepõe a uma relíquia insigne (corpo inteiro) do soldado romano São Pio Mártir (Vindo de Roma, em 1797), que na lateral esquerda pode ser contemplada o famoso quadro da Santa Ceia, do Mestre Ataíde (1828), e cinco vitrais franceses, um deles, doado pelo imperador Dom Pedro II, que mostram passagens da vida de Cristo a fim de que inspirasse os jovens formandos que os contemplassem no santuário, e claro a imagem de Nossa Senhora Mãe dos Homens – peça única, vinda de Portugal, que quando restaurada em 1990 foi encontrada uma relíquia com a seguinte oração: 

“Ó Maria Santíssima, Mãe da Misericórdia e dos pecadores, aqui está a vossos pés o menor de todos e o mais índigo filho – Alexandre – escravo vosso. Lançai, minha mãe e Senhora, sobre a alma desse enorme pecador, a vossa santíssima bênção e ponde-me os vossos piíssimos olhos e intercedei por nós a vosso Santíssimo Filho, meu Deus de Amor e Misericórdia”.


As atrações do Complexo do Santuário do Caraça são bastantes a ponto de não comportar nesse artigo, estas vão desde o museu, centro de visitantes, loja de conveniência, biblioteca, restaurante com o melhor da gastronomia mineira, os jardins, os aconchegantes aposentos, o clima próprio da serra, as trilhas, laboratório a céu aberto para instituições de ensino interessadas na biodiversidade encontrada na sua fauna e flora, e como não poderia faltar, o encontro com o lobo-guará que há 36 anos, cada noite, permite o Caraça assistir a um ritual mágico, quando o mesmo vem comer no adro da igreja. 

*Vale salientar que os primeiros padres lazaristas a virem ao Brasil foram: Pe. Manoel de Brito que foi reitor do seminário São José do Rio Comprido - RJ de 1810 a 1813, Pe. José Cardoso de Brito seu sucessor de 1813 a 1814 e Pe. Alexandre Macedo, que autorizado pelos seus superiores, serviu como Procurador da Corte do então Príncipe Regente de Portugal, D. João VI, vindo ao Brasil fugido da ameaça de Napoleão Bonaparte, em 29 de novembro de 1807. (cf. SOUZA, Maria Rebouças de “Ir. Rosalie”. História das filhas da caridade da província do Rio de Janeiro – Brasil 1849 – 2003. Ed. Vozes, Petrópolis – RJ, 2016)