No livro Ética Eudêmia Aristóteles afirma:(...) é a partir das escolhas deliberadas de alguém que julgamos o seu caráter, isto é, julgamos o caráter de alguém a partir daquilo em vista do que ele age e não a partir da sua ação (...). E é observando as escolhas que os homens fazem, antes que seus atos, que nós os louvamos ou censuramos.
Neste trecho da Ética Eudêmia Aristóteles afirma que julgamos o caráter de alguém a partir do motivo pelo qual ele age e não pela ação. Não é a ação em si que mostra o caráter do agente. Uma ação pode parecer externamente como virtuosa, mas pode ter sido executada visando interesses pessoais e não a virtuosidade.
Esta mesma posição vemos na Ética a Nicômaco, onde Aristóteles diz que o homem que não se regozija com as ações nobres não é sequer bom; e ninguém chamaria de justo o que não se compraz em agir com justiça ´(EN I 1099a 15-20).
Vemos que o caráter não pode ser julgado pelas ações, é necessário que saibamos os motivos que levaram o agente a executar tal ação. Uma ação virtuosa além de ser boa e nobre deve ser aprazível para quem a executa.
Para julgar o caráter de uma pessoa devemos saber por que ela escolheu agir assim. É o caráter que determina a escolha. Se a pessoa escolheu fazer um bem a alguém, não por sentir prazer em fazer o bem, mas porque espera, por exemplo, uma compensação financeira como recompensa, não está tendo um caráter virtuoso.
Da mesma forma, atos praticados por medo de punição não são virtuosos mesmo que praticados de acordo com a virtude; não basta a ação virtuosa, é necessário ter um caráter virtuoso. É o caráter virtuoso aliado à ação virtuosa que torna uma pessoa virtuosa. No livro II da Ética a Nicômaco (1105a 20) Aristóteles fala do caráter virtuoso e afirma que as virtudes não podem ser comparadas com as artes.
Para a arte ser boa é necessário que tenha determinado caráter e que sirva para o fim a que se propõe, e para que atinja o fim a que se destina é necessário que o agente tenha conhecimento de comoela deve ser realizada. Na arte é essencial ter o conhecimento daquilo que se pretende realizar, e uma vez realizado dentro das normas indicadas pelo conhecimento ela atinge os fins a que se propunha.
Com a virtude isto não ocorre. O conhecimento tem pouco ou nenhum peso para que um ato seja virtuoso (EN II 1105b). Não basta que o ato em si seja virtuoso, o agente deve ter tomado a decisão de realiza-lo levando em conta que é um ato virtuoso.
A virtude não se aprende como uma ciência qualquer, ela é adquirida através da prática amiudada de atos justos e temperantes. O caráter tem que ser moldado aos poucos e com insistência para a prática da virtude. Não é o conhecimento que forma um caráter virtuoso, pois mesmo a pessoa ignorante pode ser virtuosa desde que molde seu caráter praticando sempre atos virtuosos. Uma ação é considerada justa quando é praticada da mesma forma que uma pessoa justa a pratica.
Quando motivação de quem prática a justiça é unicamente a obrigação imposta pela lei esta prática de justiça deixa de ser virtude. Ela só é virtude quando a praticamos porque nosso caráter foi moldado pela prática frequente de atos justos e somos levados a praticar a justiça porque sentimos prazer em praticar um ato justo. Não julgamos o caráter de alguém pelo ato que praticou, porque só podemos conhecer o caráter de uma pessoa sabendo os motivos pelos quais ela praticou aquele ato.
É a escolha que a pessoa faz antes de praticar o ato que mostra o seu caráter, e não o ato em si. Na Ética Eudêmia Aristóteles diz que ³é observando as escolhas que os homens fazem, antes que seus atos, que nós os louvamos ou censuramos´. No livro II da Ética a Nicômaco, Aristóteles afirma que ninguém é louvado ou censurado porque sente medo ou cólera (EN II 1106a), pois ninguém escolhe ter medo ou cólera.
As pessoas são louvadas ou censuradas por suas virtudes ou vícios, e a prática da virtude só é possível porque antes de praticá-la fizemos a escolha pela virtude. Quando praticamos a virtude é porque antes fizemos a escolha de praticá-la, e como vimos anteriormente, esta inclinação para a virtude foi praticada amiudadamente até tornar-se um hábito do nosso caráter.
Praticar um ato envolve antes a escolha de praticá-lo. E é esta escolha que mostra o caráter do agente. Para Aristóteles a escolha não se identifica com o voluntário, pois mesmo as crianças e os animais inferiores participam de ações voluntárias (EN III 1111b 5-10). A escolha é um ato racional e está muito mais ligado à virtude do que as ações. A escolha se identifica com as coisas que estão em nosso poder e é pela escolha que vemos a bondade ou a maldade de uma pessoa.
ARISTÓTELES.Tópicos, Dos Argumentos Sofísticos, Metafísica, Ética a Nicômaco, Poética . São Paulo: Abril Cultural, 1973. 533 p. (Os pensadores vol. IV).
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