sábado, 25 de outubro de 2025

Missão do Japão 26/10/2025: 30º Domingo do Tempo Comum | ANO C (Lc 18,9-14) Homilia



Meus irmãos e minhas irmãs em Cristo, a liturgia deste trigésimo Domingo do Tempo Comum nos convida a um profundo exame de consciência sobre a nossa postura diante de Deus. As leituras de hoje, especialmente o Evangelho de Lucas, nos apresentam um contraste claro entre duas formas de se apresentar a Deus: a soberba autojustificação e a humilde súplica.

1.O Perigo da Autojustificação

O Evangelho (Lc 18, 9-14) nos conta a Parábola do Fariseu e do Publicano. O Fariseu entra no Templo e, em sua oração, faz uma longa lista de suas boas obras: ele é observante, justo, casto e, o mais grave, ele se compara favoravelmente com os outros, dizendo: "Eu não sou como este publicano!"

Esta é a armadilha da soberba. O Fariseu não está rezando para Deus; ele está rezando para si mesmo, como um auditório para a sua própria virtude. Ele se esquece de que tudo o que possui – a justiça, a observância – é, em última análise, um presente, uma graça. Ele se esquece da verdade que o Eclesiástico nos recorda: "O Senhor é o que ouve a súplica do oprimido e não a despreza" (Eclo 35,18 - a passagem que antecede a leitura oficial).

A humildade, meus irmãos, não é fingimento de fraqueza; é a verdade sobre a nossa condição diante da infinita santidade de Deus.

2.A Oração que Agarra a Graça: A Voz do Pobre

Em contraste, temos o Publicano. Ele não ousava levantar os olhos ao céu. Ele batia no peito, um sinal universal de dor e arrependimento sincero. A sua oração é curta, mas é a oração mais poderosa que um ser humano pode oferecer: “Ó Deus, tem piedade de mim, pecador!”

Esta não é a oração de quem merece; é a oração de quem precisa. É a oração do pobre de espírito, daquele que reconhece a sua dívida e a sua incapacidade de se salvar por mérito próprio. Ele se coloca exatamente no lugar que o Senhor espera: dependente da Misericórdia.

Jesus encerra a parábola com a sentença definitiva: “Eu vos digo que este desceu justificado para casa, e não aquele.”

Justificado. A palavra que significa "declarado justo" por Deus. A justificação não veio das obras do Fariseu, mas da humildade e da súplica do Publicano. O Senhor não despreza a oração do pobre, Ele a acolhe, pois nela reconhecemos a nossa total dependência d’Ele.

3.Olhando para o Encontro Definitivo com Deus

Esta dinâmica de humildade e dependência nos prepara para o nosso encontro definitivo com o Senhor, sobre o qual nos fala São Paulo na sua segunda carta a Timóteo (2Tm 4,6-8).

Paulo está no fim da sua jornada. Ele não se vangloria das suas conversões ou dos seus milagres. Pelo contrário, ele diz: "Eu já estou sendo oferecido em libação, e a hora da minha partida está próxima. Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé."

Paulo resume a sua vida não como um Fariseu contando méritos, mas como um servo fiel que gastou tudo o que tinha por amor ao Mestre. O seu foco não está no que ele fez, mas no que o Senhor lhe reservou: "a coroa da justiça".

A coroa de Paulo não foi conquistada com altivez, mas através da fidelidade na luta e na aceitação da dor (a libação/oferenda). O nosso encontro final com Cristo será marcado por esta mesma pergunta: Você lutou? Você guardou a fé? E, fundamentalmente, você se apresentou a Ele com a verdade da sua alma?

Se nos apresentamos com a presunção de mérito, como o Fariseu, corremos o risco de não receber nada. Se nos apresentamos com a humildade do Publicano, reconhecendo a nossa necessidade de perdão e de graça, encontramos o caminho para a justificação, o mesmo caminho que levou Paulo à sua recompensa.

4.Conclusão e Exortação

Irmãos e irmãs, que a celebração desta Missa seja para nós um ato de purificação.

  1. Pratiquemos a Humildade: Olhemos para a nossa vida e reconheçamos que toda a nossa força, união, trabalho, virtude são dádivas que requerem gratidão e serviço, e não arrogância.
  2. Reaprendamos a Oração do Pobre: Nos momentos de luta, de dúvida ou de pecado, abandonemos a autosuficiência e voltamo-nos para o altar com o coração do Publicano: "Deus, tem piedade de mim!"

Se vivermos assim, com a humildade que nos torna capazes de receber a Graça, podemos, com São Paulo, aguardar com confiança o dia em que ouviremos a voz do Senhor dizer: "Vem, bom e fiel servo! Recebe a coroa que te estava reservada." Amém.

terça-feira, 21 de outubro de 2025

POESIA: COROA DA VIDA

Obrigado aos meus anfitriões em Manaus, Nazaré e Barbosa. Ele autor da poesia a seguir, que alude à pandemia de COVID19


O coronavírus trouxe a morte pontualmente na hora incerta. Devastou vidas, trazendo a morte com sua tez fria e perversa.

Sem alforges e sem cavalo preto em fuga

a galope…

Ficamos sem leito e sem oxigênio, como náufragos sem bote.

Veio como um arrastão, levando em turbilhão, faustos e indigentes, santos e pecadores, culpados e inocentes.

A locomotiva do inferno levou em seus vagões boa e má gente em hedionda equidade de repente.

Transformou vidas em números, túmulos em valas, cidades em desertos, amigos em saudade.

A antiga ternura foi sem prazo encarcerada, sem defesa, sem réplica, sem exéquias, sem nada!

Veio com seus vagões de morte, de enfermos lotados, com fome e sede infectados.

As alegrias transformou-as em dores, sorrisos em prantos, vozes em silêncio, cores em luto de horrores.

Nem Dante Alighieri, o Águia Florentino, pensaria em um dantesco e infernal destino!

A hemoptise no pneumotórax à sua maneira foi mais fraterna com Manuel Bandeira.

Mário Quintana, com as aladas asas da Fênix, isolada no ninho, profetizara: Eles passarão, nós passarinho!

E quem sem guerra ou batalha medonha teria vivido semelhante horror em proporção tamanha?!...

Que valente Ulisses, em luta contra titãs, por sua Penélope, enfrentaria macabra Odisseia de volta à Ítaca de sua paixão?!

E agora José?

Que onda viral ainda nos (des)espera?!...

E agora, Drummond, será o fim do caminho?!...

Disse Paulo:

Viver é Cristo e morrer é lucro!...

Pedro em confirmação:

Cristo é ressurreição!

Então digamos sem medo…

Ó morte! Venha tarde, venha cedo, onde está teu galardão?!

José Barbosa de Souza

Dezembro 2020

Manaus

sábado, 11 de outubro de 2025

Missão do Japão 11/10/2025: 28º Domingo do Tempo Comum | ANO C (Lc 17,11-19) Homilia



1. Introdução: A fé que sabe agradecer

Queridos irmãos e irmãs, a Palavra de Deus neste domingo nos convida a olhar para algo que parece simples, mas é profundamente espiritual: o agradecimento.
Saber agradecer é reconhecer que a vida é dom, que nada nos pertence por direito, e que tudo o que temos e somos vem das mãos de Deus.
Mas nem sempre é assim: muitos recebem as bênçãos, poucos voltam para agradecer.

Hoje, as três leituras nos colocam diante de pessoas curadas, libertas e salvas — e todas nos mostram que a gratidão é um sinal de fé autêntica.

2. Primeira leitura: Naamã, o estrangeiro que reconhece a graça

Na primeira leitura (2Rs 5,14-17), encontramos Naamã, o sírio, um homem poderoso, mas leproso. Ele busca cura e, por meio do profeta Eliseu, mergulha sete vezes no rio Jordão — e fica curado.

Mas o mais importante não é a cura física; é o reconhecimento. Naamã entende que o que aconteceu não foi obra da água, nem de sua força, mas dom de Deus. Por isso, ele volta, agradece e professa sua fé: “Agora sei que não há outro Deus em toda a terra, senão em Israel.”

Naamã, um estrangeiro, nos ensina que a fé nasce quando reconhecemos o dom recebido. O coração que agradece é o coração que se abre para Deus.

3. Segunda leitura: A gratidão que nasce da memória de Jesus

Na segunda leitura (2Tm 2,8-13), São Paulo escreve: “Lembra-te de Jesus Cristo, ressuscitado dentre os mortos.”
É um chamado à memória agradecida. Mesmo preso, sofrendo, Paulo agradece porque sabe que Deus é fiel. Ele entende que a fé cristã não é um contrato de vantagens, mas uma aliança de amor.

Quem lembra de Jesus, quem vive da sua graça, aprende a ver a presença de Deus até nas cruzes da vida.
Por isso, o cristão é, por natureza, uma pessoa agradecida, porque reconhece que tudo é graça — até as dificuldades que nos amadurecem na fé.

4. Evangelho: O único que voltou

No Evangelho (Lc 17,11-19), Jesus encontra dez leprosos. Eles clamam: “Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!”
Jesus os envia aos sacerdotes, e no caminho são curados. Mas apenas um deles, um samaritano, volta para agradecer.

É interessante notar: todos receberam o milagre, mas só um foi salvo.
Os dez foram curados no corpo, mas apenas aquele que voltou para agradecer foi curado também no coração.

Jesus se admira e pergunta: “Não foram dez os curados? Onde estão os outros nove?”
Essa pergunta continua ecoando hoje: quantas vezes Deus nos abençoa e nós seguimos em frente sem olhar para trás, sem reconhecer, sem agradecer!

A ingratidão nos torna cegos; a gratidão nos faz ver Deus em tudo.
E o samaritano, um estrangeiro, nos ensina que o agradecimento é o verdadeiro sinal de fé: “Levanta-te e vai! Tua fé te salvou.”

5. Aplicação: A gratidão que nos humaniza e evangeliza

Vivemos num tempo de muita reclamação e pouco agradecimento.
Corremos tanto atrás do que falta que esquecemos de agradecer o que já temos:

  • o dom da vida,
  • a família,
  • a fé,
  • o alimento de cada dia,
  • as pessoas que nos amam,
  • e o próprio Deus que nunca nos abandona.

A gratidão não é só uma virtude educada — é um ato de fé.
Quando agradecemos, reconhecemos que Deus age na nossa história e que não estamos sozinhos.

E o contrário da gratidão não é a raiva, é o esquecimento. Esquecer de agradecer é perder o sentido da vida como dom.

Maria, nossa Mãe Aparecida, é o exemplo maior de gratidão: ela cantou o Magnificat, dizendo: “A minha alma engrandece o Senhor e meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador.”
O coração agradecido é um coração que se alegra em Deus!

6. Conclusão: Voltar para agradecer

Irmãos e irmãs, hoje Jesus nos convida a voltar — voltar como o samaritano, voltar como Naamã, voltar como Paulo — para agradecer.
Talvez, como eles, tenhamos muito a pedir. Mas antes de pedir, é preciso lembrar e agradecer.

Ao voltarmos o olhar para Deus e dizermos “obrigado”, nós abrimos o coração para um milagre ainda maior: a salvação.

Que esta Eucaristia — que significa “ação de graças” — nos ensine a viver cada dia com um coração que reconhece, que louva e que agradece.

Oração final:
Senhor Jesus, como o leproso curado, queremos voltar para agradecer. Obrigado pelo dom da vida, pela fé, pela Tua presença em nós. Ensina-nos a ver Teus milagres nas pequenas coisas e a viver com gratidão, porque tudo é graça. Amém.